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quarta-feira, 21 de maio de 2014

A Prisão do Príncipe (Parte 1 )

- Veja isto, Aldel. - disse Iriahin sobre uma enorme escada de onde arremessou um pesado livro para o amigo. Aldel exitou um momento sem saber se agarrava o livro ou desviava dele. Decidiu agarrar. - Página trezentos e oitenta e seis, "A Flor de Lanta".

O naithlyn carregou o livro para uma mesa onde muitos outros já estavam abertos. Folheou as páginas e encontrou a que Iria havia falado.

- A Flor de Lanta é extremamente rara. - começou a narrar em voz alta o texto enquanto lia. Iriahin pulou do alto da escada direto para o chão e se aproximou do amigo. - Encontra-se geralmente em regiões pantanosas de difícil acesso. Seu perfume é tão desagradável quanto os próprios pântanos e a coloração de suas pétalas estão relacionadas com a intensidade do cheiro...".

Aldel parou de falar e se virou lentamente para Iriahin.

- Eu não acredito nisso. - disse o naith.
- Vamos para o norte, Aldel.
- Pântanos nojentos... E perigosos... Não que eu ligue de correr riscos, mas... Por uma flor fedorenta?
- Será divertido!
- Não duvido, mas confesso que odeio pântanos. Além disso, vamos precisar de muita comida.
- Nem tanto. - Iriahin respondeu sentando numa cadeira e colocando os pés sobre a mesa.
- Nem tanto...? - Aldel estranhou, mas logo entendeu. - Você está pensando em cruzar a região sem dono, não é?
- Se é sem dono... - O garoto deu de ombros e quase caiu com cadeira e tudo quando a inclinuou para trás. - Não será por muito tempo.

Aldel estava sorrindo. Sentia o friozinho barriga de ansiedade, mas ainda assim ponderava os riscos de tudo que o amigo estava lhe dizendo.
Pode-se dizer que nesse sentido Iriahin sempre foi mais naithlyn que Aldel.
Uma das características do naithlyns é a despreocupação e a simplicidade de pensamento. No entanto, é provável que em seu curto período de vida Aldel tenha se metido em três ou quatro vezes mais confusões na companhia de Iriahin do que um naithlyn comum conseguiria durante toda sua longa vida. Ter se tornado um gato cuidadoso não é apenas natural, mas uma evolução para garantir sua auto-preservação.
Agora ele coçava com o dedo indicador direito a região da testa próxima a sua gema e Iriahin sabia que isso significava que Aldel provavelmente não estava conseguindo pensar em mais nada problemático.

- Uma aventura geralmente compensa os perigos com riquezas, não é? O que vamos ganhar com isso além da flor fedorenta? Que raios de aventura será essa a nossa?
- Nossa aventura...?

Iriahin se levantou de uma vez só e a cadeira de madeira foi direto de encontro ao chão. Ele inspirou fundo e começou seu teatro.

- É a aventura de um apaixonado! Um louco desesperado! - pulou sobre a mesa e cerrou a mão em punho. - A aventura de um herói disposto a arriscar a própria vida como prova de amor!

Iriahin foi erguendo a mão cerrada para cima como se elevasse uma espada aos céus. Estava tão inserido em seu personagem que seus olhos brilhavam reluzindo as luzes das velas da biblioteca.
Aldel se limitava a assistir. Não era a primeira vez que presenciava um surto teatral de Iria.
Na verdade, aquilo era mais frequente do que pode-se imaginar. Mas para trazer o amigo de volta a realidade ele arremessou um livro que quase o atingiu na cabeça.

- Caro senhor louco apaixonado. Pelo que eu bem te conheço seus maiores tesouros são seus problemas. Mas e a minha parte?
- ...Que tal metade dos meus tesouros e minha eterna gratidão?
- Em outras palavras, nada além da boa amizade.
- Isso... E  metade do que encontrarmos de valor.
- Gosto da parte da amizade e da metade do que encontrarmos de valor. Como sou muito gentil deixo você ficar com seus tesouros problemáticos.
- Quanta gentileza, senhor Aldel! Muito obrigado!
- Então...

Iriahin encarnou novamente seu galante personagem e ainda em cima da mesa voltou a erguer a mão.

- Que se inicie esta nossa nobre aventura em busca do perfume que o amor merece!

Os dois riram muito aquele dia.
Pegaram um mapa e começaram a planejar a rota de viagem. Paravam aqui e ali para comentar sobre as peculiaridades de certas regiões e também para imaginar a cara que Schell faria ao receber tal sinal de afeto.
Decidiram tudo. Dia e horário da partida, onde seria o ponto de encontro, o trajeto que fariam e a quantidade de suprimentos necessário.
Nos próximo dias dividiram as tarefas e as executaram metodicamente tomando precauções para não serem descobertos.
Parecia estar tudo certo, a unica coisa com a qual não contavam era...

- Iriahin. - disse Anderaken, pai de Iriahin e rei de Taslon, do lado de fora do quarto enquanto batia na porta.

Era um homem alto e de porte imponente. Tinha longos cabelos brancos e lisos, olhos azuis escuros como o oceano e pele clara. Sua expressão sempre calma e séria passava a impressão de ser um bom homem e um bom rei.

- Hey, pai! Tudo bem? - disse Iriahin, tentando disfarçar e empurrando sua mochila para debaixo da cama com o pé.

Não era incomum Anderaken visitar seu filho em seu quarto, mas notavelmente Iriahin não esperava por aquilo justo naquela ocasião.
Era como se o rei tivesse farejado no ar que o filho estava prestes a aprontar alguma coisa.
E não era pra menos...
Da mesma forma que Aldel havia aprendido a preservar o que ainda restava de suas vidas de gato, Anderaken também havia desenvolvido habilidades inconscientes de notar alterações no comportamento do filho e ele sabia que para ter certeza só precisava fazer uma pergunta.

- Iriahin... - disse ele em tom sério e desconfiado, propositadamente prolongando a ultima silaba do nome do filho. - O que é que você está aprontando agora?
- Aprontando...? Eu...?

E estava feito...
Os olhos de Anderaken se apertaram e ele imediatamente soltou uma rajada de ar pelo nariz. Sua testa se franziu em preocupação e sua boca se torceu numa notável expressão de desconforto.
Por mais que o rei não soubesse do que se tratava, ele tinha certeza que o filho estava aprontando.
Frente aquilo Iriahin fez a unica coisa que conseguia se lembrar de fazer...


- Hehe... - ...Sorrir descaradamente como cínico culpado.

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