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sábado, 31 de maio de 2014

Palavras

Post mood: Mega Man 3 OC Remix - The Passing of the Blue Crown

Se eu tivesse que escolher as palavras eu não escolheria.
Não tenho mais a capacidade de distinguir entre o certo e o errado. Justo e injusto... Bom e mal...
Abandonei em algum lugar do passado as coisas que me aproximavam desse tipo de vida.
Talvez tenha deixado passar a própria vida como é conhecida.

Me confundo constantemente. Isso pra mim é normal.
Já que crer em qualquer coisa é sempre tão complicado. A duvida é que é rotina.
E na incerteza da realidade contínua... Do momento contínuo.
Continuo o tempo todo vivendo o tempo que me resta...

...Se é que resta algum.

Digo o que quero dizer a hora em que preciso.
Mas não sei determinar o que é necessidade...
Sentir as coisas como eu sinto é como estar adormecido.
Sonhando acordado com o horizonte infinito.

Cada passo em sua direção é uma frustração, uma agonia.
O objetivo inalcançável de uma verdade esquecida.
Me agarro em mim mesmo. Me abraço.
E por vezes eu simplesmente olho no espelho...

Bom dia...

Aqui estou mais uma vez... Como sempre...
Aqui estou como nunca estive antes.
Dizendo a todos as mesmas coisas que já dizia.
Palavras e mais palavras...

E nem metade do que eu gostaria...

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Yue e Amethista: Cena na Torre

Era uma destas tardes de outono.
Do lado de fora a chuva caía fria e em gotas finas que escorriam pela janela de vidro. O céu estava nublado e nem sequer havia muito vento. Apenas aquele gotejar monótono e contínuo que facilmente nos coloca pra dormir.
Do lado de dentro o fogo ardia na lareira onde uma grande chaleira havia sido pendurada e começava a fumegar.
Havia ali também, no centro da sala sobre o piso de pedra um grande tapete felpudo, de fios altos e marrons onde um gato gordo e de pelo branco dormia confortavelmente. Estava esparramado daquele jeito que somente os gatos sabem fazer.
As poltronas pareciam meio velhas, mas ainda confortáveis. Nas paredes algumas prateleiras repletas de livros e objetos estranhos que não era fácil distinguir o que realmente era decoração ali.
Todo aquele cenário parecia dançar calmamente sob a iluminação do fogo, o que deixava Amethista ainda mais entediada.
A garota sentada numa cadeira de madeira e debruçada sobre os braços apoiados no batente da janela.
As vezes olhava para fora.... As vezes para seu reflexo...
As vezes olhava para uma gota qualquer que escorria no vidro e então de repente não estava olhando pra nada.
Ela já estava piscando mais do que o normal, passando mais tempo com as pálpebras fechadas que abertas quando a chaleira começou a apitar.

- Quanta emoção... - ela resmungou consigo mesma. - A água do chá está pronta. Uauu... Acho que vou infartar de tanta empolgação.

Voltou sua atenção para a lareira e movendo suas mãos no ar fez a chaleira flutuar de onde estava diretamente para a mesinha que ficava próxima a uma das poltronas.
O gato ao ouvir o som abanou o rabo uma unica vez. Talvez apenas para dar mostras de que ainda estava vivo.
Amethista se levantou e decidiu terminar o trabalho com as próprias mãos.
Pegou um dos objetos estranhos que decoravam o lugar, encheu de ervas e mergulhou diretamente dentro da chaleira.
Realizou esta tarefa com o mesmo cuidado que um rinoceronte teria ao tentar passar um fio pelo buraco de uma agulha.
...Então se largou sentada na maior e mais larga das poltronas individuais que havia ali.

- Ikaos. - ela chamou. - Acorda seu gato gordo. Vai chamar o Yue. O chá está pronto.

O gato nem se moveu. Estaria realmente morto?

- Ikaaaooos... - Amethista chamou novamente, sem animo. - Anda... Levanta...

Mais uma vez o gato não se moveu.
Ainda sentada na poltrona, Amethista se curvou para frente e passou a encarar o gato com seriedade.
Apertou seus olhos e prestou atenção. Sua iris roxa reluzia por entre as pálpebras com a luz do fogo enquanto ela mordia levemente o canto do lábio inferior, mantendo-se em silêncio e respirando baixinho.
Por alguns instantes o único som além da chuva e do crepitar do fogo era o de um relógio em outro comodo. E por alguns segundos Amethista realmente achou que Ikaos podia ter morrido... Pelo menos até ele levantar e baixar seu rabo em um movimento único.
A garota se pegou em duvida se ficava alegre por ainda haver vida naquele bicho preguiçoso ou se estava decepcionada...

- Pelo menos teria sido alguma agitação... - resmungou novamente consigo enquanto levantava e decidia ir ela mesma até Yue.

Mais uma vez com o movimento dos dedos fez a chaleira flutuar.

- Por favor, siga-me dona chaleira...

E então saiu daquela sala para uma outra ainda maior onde começou a subir uma escaria de madeira.
O resto da Torre, como era chamada aquela casa estranha, não estava tão quente quando a sala da lareira e por um momento ela sentiu frio. Também não estava tão bem iluminada e a pálida luz de fora acabava gerando sombras em móveis e objetos que assumiam um aspecto assustador.
...Mas não se pode dizer que ela estava assustada. Na verdade, talvez até se alegrasse caso visse um monstro ou fantasma, mas eram apenas móveis e velharias.
Ela parou diante de uma porta de madeira.

- Yue, trouxe o chá. - e bateu na porta enquanto a chaleira flutuava perto dela. - E é melhor que você queira chá. Por que se você não quiser...

Ninguém respondeu do lado de dentro do quarto.

- Yue? - ela chamou novamente enquanto batia outra vez. - Você está me ouvindo? Yue...

Um arrepio correu por sua espinha quando mais uma vez ninguém respondeu, mas talvez fosse apenas frio...
Olhou para baixo e viu uma estranha e oscilante luz saindo da fresta sob a porta.
Sua mão imediatamente subiu em direção a maçaneta.
Ela segurou firmemente e pensou duas vezes antes de girar. Mas girou... E a porta começou a se abrir devagar.
A luz de um ensolarado dia começou a escapar e a cegou brevemente ao mesmo tempo em sentia um calor de verão sendo soprado contra seu corpo pelo vento que emanava de dentro do quarto.
Seus olhos então se acostumaram com a luz e a porta que antes dava para o quarto de Yue, que ficava no alto daquela construção, provavelmente o equivalente ao quinto andar de um prédio, agora era a passagem para um bosque campo verdejante e ensolarado.
A chaleira que até então estava flutuando atrás de Amethista foi direto ao chão. Seu queixo também teria ido, mas uma vez preso pelos músculos da bochecha ele se contentou em ficar largado em boca aberta.
A garota ainda virou para o lado afim de observar a janela que havia no final do corredor, mas do lado de fora a mesma chuva vinda do céu cinza ainda caía.
Ela estava prestes a entrar quando alguém a segurou pela mão, entrelaçando seus dedos com os dela e fazendo a garota desviar a atenção.
Amethista se virou e contemplou Yue.

- Acho melhor deixarmos esse quarto fechado por enquanto, Amethista. - e com cuidado ele começou a puxar a porta para fechar.
- Mas... Por que? Esse lugar é lindo!
- Realmente é lindo, mas... - ele fez uma pausa proposital em seu discurso enquanto fechava e abria novamente a porta. Dessa vez não havia nada ali senão o seu velho e gelado quarto.- ...Prefiro não te perder pra ilusões.

Dessa vez Amethista entrou no quarto e começou a olhar ao redor, incrédula.

- Como você fez isso? - ela finalmente perguntou, depois de alguns segundos.
- Você quer mesmo saber?
- Claro que sim!!! - estava eufórica.
- Eu troco a informação por chá...
- Chá...?

"AAAAAAAAAH!!!! O CHÁÁÁÁ!!!!"

terça-feira, 27 de maio de 2014

Iriahin - A Prisão do Príncipe (Parte 2)

O momento de silêncio constrangedor  que se seguiu enquanto Iriahin sorria foi suficiente para Anderaken se decidir e agir.
Apesar de mal ter entrado no quarto, assim que que concluiu que o filho realmente estava aprontando algo, correu para fora e trancou a porta.
Iriahin ficou perplexo por um momento e não teve sequer tempo para reagir antes do som da chave sendo girada chegar aos seus ouvidos.
O príncipe correu até a porta e começou a bater com os punhos cerrados.

- Oe, pai! Mas que é isso?! - ele perguntou, gritando e iniciando a conversa através da porta fechada.
- Que caia o mundo se eu não estiver certo, Iriahin! Conte-me já o que está planejando ou não vai sair deste quarto!
- Então se segura aí que vai cair!
- Tem a ver com o seu casamento, não é?

Iriahin se calou imediatamente e por um momento só conseguiu pensar: "Velho maldito! Como é que sempre sabe?".
O plano foi executado sem falhas e no mais completo sigilo. Teria sido apenas azar o rei resolver visita-lo justo naquela noite?
De qualquer forma não adiantava mais nada negar. No momento em que Iriahin se calou, Anderaken soube que estava certo e fez questão de deixar isso claro na sua próxima fala...

- Tens uma bela noiva te esperando e um futuro ainda melhor a vir pela frente, Iriahin.
- Bela noiva?! - o príncipe pareceu realmente surpreso com aquela afirmação. - Tem mais beleza num "borthelon" do que em Schell, pai.
- Mas que exagero, Iriahin! Você não acha que já é hora de aprender a se comportar? Você é filho de Anderaken, Senhor de Taslon. É príncipe da Cidade do Amanhecer e deve pensar e agir como tal!
- Pois que seja! Se é dessa forma que diz, então digo que não me caso.
- Sinto muito, Iriahin! Mas até que cresça você não tem como escolher.
- Hehehe. Ah é?! Então eu aceito o desafio, senhor rei!

Aquelas palavras...
Fisicamente pai e filho não eram muito parecidos. Iriahin havia puxado mais a sua mãe que ao pai.
No entanto, em relação a teimosia, orgulho e espirito de luta os dois estavam páreo a páreo.
O que Iriahin fez foi transformar a coisa toda em um jogo para ambos. Um jogo muito importante que envolveria todo o futuro de Taslon e seus cidadãos, um casamento, nobres, promessas e honras e principalmente... Pai e filho.

- Mas você só pode ter ficado louco. Ainda pretende me desobedecer, Iriahin? - retrucou Anderaken em um tom mais sério.
- Eu nunca planejei casar, pra começo de conversa!
- Pois então aceito teu desafio, moleque! Está preso em teu quarto até o dia de teu casamento. Vai ter uma lição do que é desafiar o próprio sangue.
- Ha! Você é quem vai ver! Você não tem como me manter aqui dentro!
- Não por isso, moleque. Há muitas correntes no calabouço!
- ...Ainda soa melhor do que casamento. - constatou Iriahin, refletindo sobre o assunto.
- Pois saia deste quarto e logo descobrirá! Passar bem, meu filho!
- Boa noite, papai!

Havia um tom cômico e infantil na forma como os dois perdiam a paciência e acabavam discutindo.
Iriahin deu um soco na porta e fez uma careta.
Manteve a mão em punho cerrado de encontro com a madeira enquanto respirava bufando por alguns segundos.
Foram momentos de silêncio e introspecção nervosa que se resultaram em um único pensamento final...

- Aaaaah! MAS O QUE FOI QUE EU FIZ?! - ele falou alto enquanto levava as duas mãos à cabeça.

Sem perceber ele havia caído direitinho no jogo de seu pai e agora estava ali, trancado no próprio quarto sem ter a menor ideia de como faria para chegar ao ponto de encontro onde Aldel provavelmente já aguardava.
Não demorou até ele ouvir dois ou talvez três soldados se aproximarem da porta do quarto pelo lado de fora.
Era óbvio que Anderaken não facilitaria e aqueles soldados montando guarda eram um claro sinal disso.
Aquela altura toda a guarda do castelo e todos os empregados já deveriam estar cientes do castigo do príncipe.
Iriahin andou de um lado para o outro no quarto tentando pensar em algum plano, mas...

- Tudo o que posso fazer é não piorar a situação. - falou consigo mesmo novamente enquanto caía de costas na cama.

Os boatos se espalhariam e logo Aldel saberia do ocorrido.
Talvez então tivessem alguma chance.

- Eu não podia desejar melhor começo pra esta aventura... - e sorriu. - ...Se fosse fácil, não valeria a pena.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Estrelas

Por favor, não me ignore. Não dessa vez.
Ouça a minha voz... Por favor... Ouça...
Você sabe que eu estou aqui.
...Você tem que saber...
Feche seus olhos... Sinta...
Eu estou aqui!

Eu sei que você pode me ouvir...
Sei que está cansado. Sei que se sente perdido...
Apenas por um momento preste atenção em mim.
...Mesmo que eu não tenha a saída.

Ouça a música... Ouça com atenção.
Deixe a música te guiar...
Você sabe que pode. Já fez isso antes.
Já fez isso muitas e muitas vezes.

Não é tão difícil quanto parece.
Você consegue...
Apenas ouça... E então...
...Conte-me o que vê...

Eu só vejo estrelas...

quarta-feira, 21 de maio de 2014

A Prisão do Príncipe (Parte 1 )

- Veja isto, Aldel. - disse Iriahin sobre uma enorme escada de onde arremessou um pesado livro para o amigo. Aldel exitou um momento sem saber se agarrava o livro ou desviava dele. Decidiu agarrar. - Página trezentos e oitenta e seis, "A Flor de Lanta".

O naithlyn carregou o livro para uma mesa onde muitos outros já estavam abertos. Folheou as páginas e encontrou a que Iria havia falado.

- A Flor de Lanta é extremamente rara. - começou a narrar em voz alta o texto enquanto lia. Iriahin pulou do alto da escada direto para o chão e se aproximou do amigo. - Encontra-se geralmente em regiões pantanosas de difícil acesso. Seu perfume é tão desagradável quanto os próprios pântanos e a coloração de suas pétalas estão relacionadas com a intensidade do cheiro...".

Aldel parou de falar e se virou lentamente para Iriahin.

- Eu não acredito nisso. - disse o naith.
- Vamos para o norte, Aldel.
- Pântanos nojentos... E perigosos... Não que eu ligue de correr riscos, mas... Por uma flor fedorenta?
- Será divertido!
- Não duvido, mas confesso que odeio pântanos. Além disso, vamos precisar de muita comida.
- Nem tanto. - Iriahin respondeu sentando numa cadeira e colocando os pés sobre a mesa.
- Nem tanto...? - Aldel estranhou, mas logo entendeu. - Você está pensando em cruzar a região sem dono, não é?
- Se é sem dono... - O garoto deu de ombros e quase caiu com cadeira e tudo quando a inclinuou para trás. - Não será por muito tempo.

Aldel estava sorrindo. Sentia o friozinho barriga de ansiedade, mas ainda assim ponderava os riscos de tudo que o amigo estava lhe dizendo.
Pode-se dizer que nesse sentido Iriahin sempre foi mais naithlyn que Aldel.
Uma das características do naithlyns é a despreocupação e a simplicidade de pensamento. No entanto, é provável que em seu curto período de vida Aldel tenha se metido em três ou quatro vezes mais confusões na companhia de Iriahin do que um naithlyn comum conseguiria durante toda sua longa vida. Ter se tornado um gato cuidadoso não é apenas natural, mas uma evolução para garantir sua auto-preservação.
Agora ele coçava com o dedo indicador direito a região da testa próxima a sua gema e Iriahin sabia que isso significava que Aldel provavelmente não estava conseguindo pensar em mais nada problemático.

- Uma aventura geralmente compensa os perigos com riquezas, não é? O que vamos ganhar com isso além da flor fedorenta? Que raios de aventura será essa a nossa?
- Nossa aventura...?

Iriahin se levantou de uma vez só e a cadeira de madeira foi direto de encontro ao chão. Ele inspirou fundo e começou seu teatro.

- É a aventura de um apaixonado! Um louco desesperado! - pulou sobre a mesa e cerrou a mão em punho. - A aventura de um herói disposto a arriscar a própria vida como prova de amor!

Iriahin foi erguendo a mão cerrada para cima como se elevasse uma espada aos céus. Estava tão inserido em seu personagem que seus olhos brilhavam reluzindo as luzes das velas da biblioteca.
Aldel se limitava a assistir. Não era a primeira vez que presenciava um surto teatral de Iria.
Na verdade, aquilo era mais frequente do que pode-se imaginar. Mas para trazer o amigo de volta a realidade ele arremessou um livro que quase o atingiu na cabeça.

- Caro senhor louco apaixonado. Pelo que eu bem te conheço seus maiores tesouros são seus problemas. Mas e a minha parte?
- ...Que tal metade dos meus tesouros e minha eterna gratidão?
- Em outras palavras, nada além da boa amizade.
- Isso... E  metade do que encontrarmos de valor.
- Gosto da parte da amizade e da metade do que encontrarmos de valor. Como sou muito gentil deixo você ficar com seus tesouros problemáticos.
- Quanta gentileza, senhor Aldel! Muito obrigado!
- Então...

Iriahin encarnou novamente seu galante personagem e ainda em cima da mesa voltou a erguer a mão.

- Que se inicie esta nossa nobre aventura em busca do perfume que o amor merece!

Os dois riram muito aquele dia.
Pegaram um mapa e começaram a planejar a rota de viagem. Paravam aqui e ali para comentar sobre as peculiaridades de certas regiões e também para imaginar a cara que Schell faria ao receber tal sinal de afeto.
Decidiram tudo. Dia e horário da partida, onde seria o ponto de encontro, o trajeto que fariam e a quantidade de suprimentos necessário.
Nos próximo dias dividiram as tarefas e as executaram metodicamente tomando precauções para não serem descobertos.
Parecia estar tudo certo, a unica coisa com a qual não contavam era...

- Iriahin. - disse Anderaken, pai de Iriahin e rei de Taslon, do lado de fora do quarto enquanto batia na porta.

Era um homem alto e de porte imponente. Tinha longos cabelos brancos e lisos, olhos azuis escuros como o oceano e pele clara. Sua expressão sempre calma e séria passava a impressão de ser um bom homem e um bom rei.

- Hey, pai! Tudo bem? - disse Iriahin, tentando disfarçar e empurrando sua mochila para debaixo da cama com o pé.

Não era incomum Anderaken visitar seu filho em seu quarto, mas notavelmente Iriahin não esperava por aquilo justo naquela ocasião.
Era como se o rei tivesse farejado no ar que o filho estava prestes a aprontar alguma coisa.
E não era pra menos...
Da mesma forma que Aldel havia aprendido a preservar o que ainda restava de suas vidas de gato, Anderaken também havia desenvolvido habilidades inconscientes de notar alterações no comportamento do filho e ele sabia que para ter certeza só precisava fazer uma pergunta.

- Iriahin... - disse ele em tom sério e desconfiado, propositadamente prolongando a ultima silaba do nome do filho. - O que é que você está aprontando agora?
- Aprontando...? Eu...?

E estava feito...
Os olhos de Anderaken se apertaram e ele imediatamente soltou uma rajada de ar pelo nariz. Sua testa se franziu em preocupação e sua boca se torceu numa notável expressão de desconforto.
Por mais que o rei não soubesse do que se tratava, ele tinha certeza que o filho estava aprontando.
Frente aquilo Iriahin fez a unica coisa que conseguia se lembrar de fazer...


- Hehe... - ...Sorrir descaradamente como cínico culpado.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Iriahin - Príncipe de Taslon

Ouvindo: Symphonic Fantasies - Chrono Medley part 1/2 e 2/2

- Hahaha, veja só isto Aldel... - disse Iriahin com voz irônica enquanto lia uma carta e gesticulava teatralmente para enfatizar o que narrava. - "Não há momento do dia que não pense em você e sinto-me mais feliz a cada nova manhã. Meu amor cresce a cada segundo...". Aí vem um monte de blá-blá-blá... E... Aqui! "Anseio pelo dia em que fitarei mais uma vez o brilho de Taslon em seu olhar...". HÁ! Pois que vá sonhando!

O garoto amassou a carta, jogou para cima e com um chute a mandou para dentro da floresta.
Este era Iriahin, príncipe daquela conhecida como Taslon, a Cidade do Amanhecer, e filho de Anderaken. Um garoto que aparentava não ter mais que dezoito anos. Olhos escuros, castanhos no claro e eventualmente azulados em algumas ocasiões. Cabelos negros e sempre bagunçados apesar de todos os esforços que seus cuidadores reais sempre tiveram para com ele.
De fato, da realeza Iriahin só carregava o título, pois pela aparência e comportamento dificilmente seria tomado por príncipe.
O cabelo despenteado era apenas parte de seu visual. Tinha conjuntos de roupas velhas, sujas e rasgadas guardadas nos mais diversos cantos da cidade e do castelo, prontas para serem usadas sempre que escapava do castelo.
E não é preciso dizer que "escapar" do castelo era algo que fazia com certa frequência. Na verdade os tutores e soldados já não se incomodavam mais em persegui-lo como faziam quando era menor, mas ainda assim Iriahin preferia estas roupas do que as pomposas vestes da realeza.

- Não devia fazer pouco caso do amor da jovem Schell, Iriahin. - replicou Aldel, o amigo que estava sentado em um galho de árvore. - Ela parece sincera em suas palavras.

O garoto não poderia ser mais diferente e ao mesmo tempo não poderia ser mais parecido com o príncipe.
Para começar, apesar de fisionomicamente serem muito parecidos com humanos, nenhum dos dois eram.
Enquanto Iriahin pertencia a raça conhecida como Lumnus, Aldel pertencia aos Naithlyns.
E sendo um naithlyn, Aldel era um amante da liberdade e da arte... Pelo que ele entendia por arte.
Esta raça muito peculiar é dotada da capacidade de mudar de forma, abandonar a aparência humana e se transformar em uma espécie de gato de duas caudas.
...Coisa que os lumnus não podem fazer.
Além disso os naithlyns possuem em suas testas uma pequena jóia que realmente faz parte de seus corpos e varia de coloração e forma de acordo com o indivíduo.
Na forma de gatos seus pelos são da cor e padrões de seus cabelos, no caso de Aldel um tom roxo e espetado. Na forma humana o garoto aparenta ter cerca de quatorze anos, com os olhos e a gema em sua testa, ambos em um tom azul escuro.

- Amor?! Há mais amor nesta árvore em que você está que no coração de Schell, Aldel. - replicou Iriahin. - Ela nunca teria escrito esta carta.
- E como você sabe?
- A letra da assinatura era diferente! Provavelmente o pai contratou algum idiota pra escrever e ela foi obrigada a assinar.
- Se você diz... Mas é tua noiva de qualquer forma, não é? Será tua esposa... E não parece uma boa ideia que ela te odeie.
- Que me odeie até seu coração virar pedra! E isso acontecerá muito antes dela me ter como marido.

Aldel, que até então estava sossegadamente deitado em um galho e recostado no tronco da árvore, finalmente abriu os olhos e voltou sua atenção para o amigo.

- O que quer dizer? - perguntou, já prevendo o que viria a seguir.
- Bem... Eu não posso casar se não estiver aqui, não é mesmo?

Sim... Ele estava com aquele olhar...
E Aldel reconheceu no momento em que viu.
Os olhos brilhando por trás de pálpebras semi-cerradas e um meio sorriso no canto dos lábios. A expressão inconfundível que Iriahin tinha no rosto sempre que estava planejando aprontar alguma coisa.

- Ha! Vai fugir?!
- Fugir? - Iriahin fingiu indignação. - Não! Fugir é um termo muito forte para um problema tão pequeno. Vou partir em uma aventura!
- Sei. - Aldel sorriu. - Por que é que prevejo um rei furioso?
- Antes ele furioso do que eu. Alias, pensando bem... Não fui eu quem prometeu nada. Se ele não gostar, que desfaça essa palhaçada de casamento.

Aldel ponderou por um momento e...

- Faz sentido. - disse antes de pular da árvore para perto do amigo. - Pelo visto você já pensou em tudo.

O príncipe apenas sorriu maliciosamente e os dois se colocaram a caminhar.

- Devemos partir o mais cedo possível. Sei que meu pai já deve suspeitar de mim. Mas lembre-se! Isto não é uma fuga, é uma aventura!
- Pois bem, que seja. Em que se baseia esta nossa aventura?

...E lá estava novamente... Aquele olhar na cara deslavada de Iriahin.
Aldel não pode evitar gargalhar.

domingo, 18 de maio de 2014

Yue Jaded - Memórias 01

Aquele não era um dos meus lugares favoritos, ainda assim eu gostava de estar lá e até me sentia confortável.
O cheiro dos livros misturados ao silêncio das pessoas ao redor... As velas e lamparinas quebrando a escuridão da sala sem janelas... Tudo isso fazia com que eu sentisse como se aquele lugar fosse um mundo a parte. Talvez, quem sabe, a ante-sala para diversos outros mundos e realidades que se escondiam em cada um dos livros.
Esta era a biblioteca e dentro dela eu viajei.
Estava ali sentado com uma enorme pilha de livros diante de mim. Estavam espalhados sobre a mesa, abertos em diferentes páginas que eu já nem sequer olhava mais. A concentração para continuar minha pesquisa desaparecera há pelo menos uma hora atrás e desde então não havia voltado.
Olhava ao redor e via uma série de pessoas em roupas de mangas largas e caídas. Vestes espaçosamente confortáveis, mas nem por isso menos estranhas.
...Bem... Mesmo que eu achasse as roupas estranhas, na verdade o estranho era eu. O único ali que não era aluno... O único de vestes claras naquele oceano de panos escuros.
Afastei os livros para o lado, cruzei meus braços sobre a mesa e a seguir deitei minha cabeça. Fiquei olhando fixamente para uma parede a qual tinha certeza absoluta que me separava do mundo externo. Havia neve lá fora caindo e flocos leves e brancos... E eu não precisava de janelas pra saber disso. Eu podia sentir.
Suspirei profundamente...
Meus olhos foram lentamente se fechando... Eu fui começando a adormecer...

- Com licença. - ouvi chamar ao meu lado.

A unica parte de meu corpo que se moveu foram meus olhos. Nem mesmo minha bochecha desgrudou um milimetro sequer dos meus braços quentes enquanto vislumbrava aquela jovem garota parada ao lado da minha mesa com uma porção de livros nos braços.
Seus cabelos castanhos e lisos desciam até pouco além dos ombros e seus olhos verdes reluziam com as luzes das velas sobre a mesa. Sua pele era branca, com algumas pintinhas espalhadas pelo rosto. Havia um contraste entre seus lábios rosados e suas bochechas avermelhadas.
Ela sorriu.

- As outras mesas estão ocupadas. Eu poderia me sentar aqui com você? Digo... A sua é a unica que ainda tem algum espaço.

Acenei que sim com a cabeça, mas ainda sem descolar minha bochecha de meus braços. Eu estava realmente confortável daquele jeito... Provavelmente a cena foi engraçada, pois ela sorriu novamente.
Ou talvez só estivesse feliz por ter encontrado um lugar para despejar aquele monte de livros e se acomodar.
Ela sentou na cadeira a minha frente, abriu uma fresta entra entre os livros que nos separavam e estendeu a mão.

- Meu nome é Danielle. Muito prazer....

"Poxa Danielle... Minha posição confortável..." - Pensei comigo. Mas ainda assim descruzei os braços, apoiei o queixo na mesa e fitando-a nos olhos a cumprimentei preguiçosamente.
Valeu a pena pelos olhos...

- Yue... - Balbuciei. - Yue... "O Estranho".
- Muito prazer, senhor estranho. - falou enquanto apertava minha mão. Fiquei grato por ela ter mãos quentes. - O que está estudando?
- Princípios da Alta Magia... Elementos Astrais... Fundamentos do Equilíbrio... E... - fiz uma pausa, apenas para aumentar o drama. - Também peguei esse livro de culinária.
- Culinária?
- ...Tem ilustrações muito realistas e apetitosas.

Dessa vez eu tive certeza que a risada era devido minha piada.

- Corajoso você. São livros muito avançados... Exceto pela culinária, eu diria.
- Como assim? Não subestime a culinária... Para mim é o pior de todos.

Desde então nos tornamos amigos.
Ela me contou a história de sua vida. Falou a respeito de sua cidade natal, seus amigos de infância, sua família, sonhos e desejos. Em troca perguntava-me a respeito de tudo aquilo que tinha curiosidade sobre o mundo lá fora e a meu respeito.
Não que eu respondesse tudo... Mas não posso dizer que era fácil dissimular e me esquivar de certas perguntas.

- Você está mudando de assunto novamente! - ela dizia. - Afinal, por que você que ser tão misterioso?
- Isso também é um mistério.

Logo a primavera chegou e eu tinha de partir. Os jardins já estavam coloridos e repletos de animais quando fui encontrar Danielle na sala de músicas para me despedir. Do lado de fora, no corredor, eu já podia ouvir o som de um piano e as risadas de Dani.
Bati duas vezes na porta e entrei. Uma amiga de Danielle estava tocando o piano e não se deixou interromper quando me viu entrar. Minha bela amiga no entanto estava sentada na janela que dava para as fontes do jardim com uma perna balançando para fora e assim que me viu arremessou o livro que tinha nas mãos.
Agarrei o livro no ar com facilidade usando apenas uma das mãos. Puro reflexo.
Desde que Dani descobriu esta minha habilidade não havia parou mais de arremessar coisas em mim, assim como havia feito naquele exato momento.
No entanto eu estava encantado com a cena.
A luz do sol da manhã invadia o comodo e a banhava de forma angelical. A aura dourada refletida em seus olhos e cabelos misturava-se com a música e eu não tive qualquer opção a não ser congelar no lugar e observar.

- Yue! - ela chamou. - Yuuuueeeeee!!!

A música já havia acabado e foi sua voz que me trouxe de volta para a realidade.
...Como raios aquele livro havia parado na minha mão?

- Vai ficar aí parado até quando? - ela perguntou enquanto fazia uma careta simpática.

- Eu estava apenas observando a paisagem.
- A paisagem é?
- Sim. Bela paisagem...
- Como você é bobo! - ela riu , se aproximou e me puxou pela mão. - Deixe-me lhe apresentar minha amiga. Yue, esta é Aria. Aria, esta pessoa da qual lhe falei... Yue Jaded.

Ela nos apresentou e notei no fundo dos olhos de Aria uma estranha familiaridade. Podia jurar que a conhecia de algum lugar.

- Yue? Então você é o famoso Yue Jaded? Ouvi muita coisa a seu respeito. - ela olhou para Dani nesse momento. - E posso garantir que nada do que ouvi é mentira.
- Você falou pra ela de como eu estou sempre atrasado, não é? - falei olhando para Dani.

Aria riu e Dani agarrou seu braço enquanto me olhava. Estava notando meus trajes, diferentes naquele dia devido a viajem que deveria fazer.

- Não, nada disso... - Aria continuou. - Ela comentou algo a respeito de "estranho", mas parece que sua adorável amiga prefere ignorar seus defeitos e só ver qualidades. Mas posso dizer duas coisas com certeza absoluta! Uma delas é que estou com ciumes! Vocês ficam tanto tempo juntos que ela nem lembra mais de mim!
- Aaah tá bom! - disse Danielle, apertando o braço da amiga e fazendo careta antes de lhe dar um beijo na bochecha.

Eu ri, mas sabia que aquelas palavras eram sinceras.

- E qual a segunda coisa?
- Você realmente está atrasado.

Coisa estranha de se ouvir de uma pessoa que mal conhece, ainda em um tom mais sério do que o da ocasião.
Durantes poucos segundos tentei compreender aquilo tudo. A sensação de já conhecer Aria... A maneira como ela falava comigo... Ainda assim fazia um esforço para não deixar transparecer minha curiosidade. Então apenas respondi.

- Tem toda razão.

Danielle pediu a Aria que tocasse mais uma música no piano e então, oferecendo sua mão me convidou para dançar.
...Como recusar?

- Esta não parece ser mais uma de suas costumeiras visitas. - ela começou falando. - Tem algo para contar?
- Na verdade... Bem... - senti um peso no coração e alguma coisa dentro de mim me fazia querer ficar. - Eu vim me despedir, Dani.
- Eu imaginei... - ela deu um sorriso triste e forçado, mas baixou a cabeça depois. - Já imaginava que logo isto iria acontecer. Quando você volta?
- Não sei dizer... Pra ser sincero é possível que não volte.
- E ao menos uma vez poderia me revelar um de seus segredos e contar para onde vai?
- Apenas se prometer não me seguir...

Ela permaneceu de cabeça baixa durante algum tempo sem dar qualquer resposta. Continuávamos dançando e eu pude sentir como ela estava confusa. Eu mesmo estava confuso naquele momento. Havia um oceano de duvidas e pensamentos que corriam para todos os lados num fluxo descompassado.

- Não sei o que dizer... - ela falou por fim. Ergue os olhos ao encontro dos meus e isto me preencheu com um profundo frio interior. - Talvez... Boa sorte?
- Isto é você prometendo? - arrisquei e ela simplesmente acenou que sim. - Então... Vou a Artafria, para a fortaleza de Artafria.

Ela parou no lugar e no mesmo instante se afastou de mim. Aria, notando a mudança do clima entre nós, também parou de tocar e passou a nos olhar com curiosidade.

- Por que? Por que você vai pra lá? - Danielle se afastou mais um passo como se visse a morte diante de si. Estava aterrorizada.
- Tem alguém que eu preciso muito encontrar... E algo que eu não posso deixar de fazer.
- Você sabe a respeito das histórias daquele lugar, não sabe? Sabe a respeito da besta? E do grupo enviado por Seriah? Todos que nunca retornaram?

Ela tinha razão. Havia milhões de motivos pelos quais eu não deveria partir. Mas por mais razões que ela pudesse listar, me peguei pensando que o único que realmente importava para mim era ela mesma.
Procurei prestar atenção a tudo o que ela dizia, mas em algum momento eu só consegui pensar que se ela pedisse... Se ela simplesmente pedisse...

- Yue! Você está me ouvindo? Do que é que você está rindo, Yue?!
- Eu estou... Apenas sorrindo.

De repente eu havia percebido. Eu havia entendido o que sentia.
Agora, mais do que nunca, eu tinha que ir.

- Pode ser um pouco de presunção minha, mas não pretendo morrer por lá, Dani. Eu sou Yue Jaded...
- Eu não entendo você. Achava que entendia até esse exato momento, mas... - ela se afastou e sentou na borda interna da janela. Baixou a cabeça e desviou seu olhar para fora. Não soube dizer se estava triste, irritada ou ambas as coisas.

Aria se aproximou de mim e olhou em meus olhos com um ar profundamente interrogativo expresso em seu rosto.

- Você não parece ser a mais ajuizada das pessoas que um dia conheci, mas isto não quer dizer que você não tenha algo ai dentro desta cabeça...
- Cuide bem dela.

Saí dá sala e deixei meu presente junto ao livro que ela havia arremessado em mim.
Me coloquei na estrada dentro de uma carruagem rumo ao mar. Pensava em tudo o que me havia sido dito. No grupo enviado por Seriah. No próprio Seriah e em como as coisas eram quando estava perto dele.
Quando a tarde do terceiro dia de viagem chegou  eu estava olhando através da janela da carruagem. Via as primeiras estrelas refletidas nas escuras águas do oceano para o qual eu seguia.
Muita gente não sabe, mas o vento carrega mensagens de todo canto do mundo.
...Eu sentia o vento... E ouvia suas mensagens.

O vento daquela noite me contava sobre Danielle.

sábado, 17 de maio de 2014

Em Desvantagem

Ouvindo: Gackt - Leeca

E então de olhos fechados sinto o sono chegar.
Se não fosse por essa tentativa de resgatar um velho hábito provavelmente já estaria dormindo.
Mas não posso desistir tão facilmente, não é mesmo?
Eu... Que um dia tive entre minhas promessas mais importantes "Nunca desistir".

Mesmo quando busco uma emoção... Mesmo quando busco uma memória.
O sol esta nascendo lá fora e o cinza do céu é quase tão cinza quanto as paisagens aqui dentro.
...Dentro de minha mente..

Não ouso reclamar de algo que eu mesmo construí.
Mas mesmo sem ter mudado, de alguma forma este meu eu não é o mesmo do passado.

O que vejo passando e o que vejo congelado em fotos já não tem mais qualquer significado.
Em minha mente tudo é apenas um amontoado de coisas sem significado. Sem importância...

E passando tão rápido.

Em segundos estará tudo acabado.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Yue Jaded e Amethista 02

Ouvindo: Gackt - Saikai Story (Instrumental)

Assim que avistou sua presa, Amethista apertou os olhos e prendeu a respiração por alguns instantes.
Inconscientemente seus movimentos se tornaram mais lentos e mais comedidos.
Estava a metros de distancia de seu alvo, mas ainda assim se encolheu atrás de uma árvore e não conseguiu evitar rir baixinho.
Lentamente voltou a olhar... Ele ainda estava ali, parado.

- Eu tenho que ser rápida! - ela pensou consigo mesma.

Saiu de seu esconderijo. Se posicionou ao lado da árvore e retesou seus músculos.
Uma brisa suave soprou em sua direção. Ela sentiu o cheiro da grama e das flores, mas nem percebeu. E então, de repente, irrompeu numa corrida desenfreada e até mesmo um pouco desajeitada, tentando atingir a maior velocidade possível no menor tempo.
A consequência foi uma grande aceleração numa corrida completamente descoordenada.
Seu grito veio tarde, mais como um aviso de cuidado do que como uma recepção calorosa, ainda assim, saltou sobre sua presa com toda a velocidade que havia conquistado.

- Yueeeeeeeeee!!! - gritou Amethista quando pulou.

E que pulo...
Ela havia adquirido este costume recentemente. Aproveitava-se de qualquer oportunidade possível para tentar pegar Yue desprevenido.
Todas as outras tentativas haviam resultado em falha, no entanto, ironicamente naquela ela foi bem sucedida.
Yue, que estava de costas para a garota mal teve tempo de se virar para olhar quando seus corpos se encontraram.
A cena passou para ele como que em câmera lenta. Uma garota de longos cabelos roxos o atingindo com a fúria de mil sóis numa espécie de abraço que mais parecia um jogador de futebol americano tentando atropelá-lo. De repente o céu apareceu diante de seus olhos e então o chão e novamente o céu.
Ele não apenas caiu para trás com Amethista sobre si, mas ambos acabaram rolando barranco abaixo numa mistura de braços, pernas, grama e flores arrancadas até finalmente pararem, metros longe de onde estavam.
Amethista começou a rir antes mesmo de Yue soltá-la.
Ele ainda teve tempo de abraçar e tentar proteger a cabeça da amiga de qualquer pedra enquanto amenizava a maior parte do impacto para ela, mas seu esforço passou completamente despercebido.
Naquele momento esta estava tão satisfeita consigo mesma que vazava alegria pelos poros.

- Eu consegui! - disse ela, eufórica. - Finalmente consegui!

Yue ainda estava deitado em silêncio olhando para o alto e vendo as coisas girarem enquanto a garota corria ao seu redor como uma criança de seis anos.

- Eu te peguei, Yue Jaded! MWA HA HA HA! - ela falou, parando e apontando para ele com uma pose de super vilã que não combinava em nada com as flores espalhadas pelo seu cabelo bagunçado e muito menos com as manchas de terra no rosto.
- Ok. Ok... Eu admito. Você me pegou, Amethista.
- MWA HA HA!
- Agora com licença... Eu tenho que me transformar em bolo.
- Sim, sim... Em bolo! Não, pera... Como é que é?!

Quando Amethista olhou novamente para onde Yue deveria estar só havia um enorme bolo de chocolate transbordando recheio pelas laterais.
Ela piscou algumas vezes, perplexa. Aproximou-se lentamente e com todo cuidado cutucou parte do recheio com o dedo.
Ainda mais devagar ela levou o dedo até a boca  e...

- É bolo mesmo...
- Sim... Sou um bolo.
- Você não pode ser um bolo, Yue!!!
- Agora que você me pegou minha maldição foi quebrada... Posso viver feliz em minha forma original. Eu sou um bolo, Amethista.
- Não...

Foi então que Yue-Bolo arremessou um morango que atingiu Amethista bem na testa.

- Hey! Não...
- Eu não posso evitar... - disse Yue-Bolo enquanto jogava outro morango e a atingia na bochecha. - É minha natureza de bolo!

Outro morango a atingiu... E mais outro... E outro...
Até que ela finalmente a garota acabou pegando um deles com a boca em pleno ar.

Quando seus olhos se abriram Amethista encarou diretamente os olhos negros de Yue. Ele a olhava com uma expressão curiosamente estranha e foi então que ela sentiu algo fazer cocegas em sua língua. Olhou para baixo e percebeu que tinha o dedo indicador de Yue dentro da boca.
Ela cuspiu e gritou, se afastando tão rápido pela cama que acabou caindo no chão e puxando os lençóis pela borda oposta.

- Bom dia, bela adormecida. - Yue falou como se nada tivesse acontecido.
- Bom dia... - respondeu Amethista, sonolenta e frustrada, no chão, levantando uma mão para acenar que estava bem.
- Que tipo de sonho você estav...
- Cala a boca. Saí daqui! - ela respondeu de imediato sem deixar o garoto finalizar sua pergunta. Yue achou melhor obedecer. Deu de ombros e saiu do quarto coçando a cabeça.

"Você fica melhor como bolo, seu idiota."

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Yue Jaded e Amethista

Ouvindo: L'arc en Ciel - Forbidden Lover (Piano Instrumental)

A noite estava fria e calma.
Mais uma daquelas noites solitárias em que o céu nublado parece fazer nossos pensamentos se perderem enquanto as nuvens escondem qualquer luz de esperança, seja da lua ou das estrelas.
Na cidade o movimento continuava o mesmo. Sexta feira... Quase sábado. Carros e pessoas passando.
Para elas não havia esta tal solidão. Ou talvez existisse sim. Uma marca tão fria quanto aquela noite, em cada coração humano que desesperadamente buscava por companhia, fosse nos amigos, em um abraço, em um beijo. Talvez em uma boa dança ou em um copo de bebida como aquele que ele raramente tomava.
Sempre lugares altos. sempre distantes da multidão... Um costume que poucas pessoas haviam notado ao longo de tantos e tantos anos humanos.
Contemplava o céu como há muito tempo não fazia...
Ouvia o vento soprando e não mais reconhecia as mensagens que trazia.
De todos os corações daquele lugar, seria aquele o mais solitário?

Leve como uma pluma a angelical garota veio descendo flutuando.
Ele, sentado no parapeito da sacada não esboçou qualquer reação quando ela parou levitando no ar bem diante dele.
...Como se fosse a coisa mais normal do mundo...
O tom roxo dos cabelos ondulados dela facilmente podiam ser confundidos com preto ou ruivo. Os longos fios balançavam ao vento.
Ela o fitava com olhos de iris igualmente roxas. Apertava os lábios em uma expressão preocupada de quem procura no outro a razão para tamanha apatia.
Uma busca continua e sempre sem respostas.
Ele não desviou o olhar. Encarava aqueles olhos quase ingênuos com os seus. Negros, profundos... Talvez vazios ou talvez tão repletos de memórias...
Alguém na rua, metros abaixo de onde estavam, gritou alto e riu. Uma garota que corria de sua amiga em uma espécie de brincadeira de bêbados. Foi como uma deixa para o suspiro de Amethista.
Ela inspirou profundamente e fechou os olhos enquanto deixava o ar escapar lentamente. Seu sorriso aumentou devagar até tomar por completo seus lábios, então, ainda flutuando no ar, aproximou-se de Yue até seus rostos não estarem mais distantes que um palmo.
Ainda sério, com a mesma expressão vazia, ele continuava a olhar.
Seus olhos não se descolaram nem por um momento enquanto ela lentamente ergueu a mão e com o dedo indicador cutucou a testa do parceiro.

- Vai acabar com rugas, senhor Yue Jaded. - Ela falou em tom descontraído, mas ele não reagiu ou respondeu. - E o que é isso que está bebendo?

Ela cheirou o ar e por um momento pareceu uma coelha ou um cachorro desconfiado.

- Isso é vodka? - Perguntou com olhos apertados. - Não acredito.
- Sake... - Disse Yue, respondendo enfim.
- E por que é que o senhor está tomando sake, senhor Yue? - ela perguntou enquanto que por dentro só conseguia pensar: "Isso, mantenha-o falando".
- É meu aniversário.
- Mentiroso...
- É o seu aniversário...
- NÃO É MEU ANIVERSÁRIO! - Amethista respondeu quase gritando.
- Eu estou bebendo... Por que...
- Por que...?

Ele pegou a garrafa e ergueu entre os dois bem na altura dos olhos.

- Olhe bem... - Ele disse enquanto agitava o conteúdo.
- O que é que tem?
- Eu bebo por que é liquido. Se fosse solido talvez eu comesse...

Um breve momento de silêncio se seguiu entre os dois depois desta péssima piada e Amethista se contentou em sorrir e balançar a cabeça em negação. Ela sabia, melhor do que ninguém, como ele se sentia. Estavam conectados de uma forma profunda e inseparável. Ainda assim, mesmo conhecendo seus sentimentos, ela não tinha como saber as razões.
Então como de costume ele fazia alguma piadinha e sorria. Apenas mais uma mentira... Apenas para dizer "Estou bem. Não se preocupe.".

- Seu idiota...

Ela sentou no parapeito da sacada bem ao lado de Yue e roubou seu copo.

- Hey, pega leve com isso. - Ele falou enquanto ela virava o conteúdo em um gole só. - Da última vez eu tive que te carregar.
- Recarrega! - Ela respondeu, ignorando totalmente o aviso e estendendo o copo.
- Já consigo prever como essa noite vai terminar...

Encheu o copo de Amethista e depois bebeu da própria garrafa.
Olhavam para as luzes da cidade, para os carros passando e para o grupo de amigos no qual as duas garotas que ainda a pouco brincavam agora cantavam desafinadas alguma musica velha.

- Yue... - Começou Amethista, sentindo as bochechas mais quentes e o álcool começando a subir. - Por que é que você quer destruir esse mundo afinal?
- ...Por que será...? - Ele respondeu, evasivo como sempre. E ela bebeu mais um gole.
- Yue... - Dessa vez ela se virou para olhá-lo. - Se você quer tanto assim... Faça o desejo...

...E ele se virou para encarar Amethista nos olhos e o vento soprou mais forte movendo suas roupas e cabelos.

- Faça o desejo... E eu realizarei.

Após alguns segundos naquela situação silenciosa, ela de repente se sentiu muito envergonhada e se virou pra frente, fazendo qualquer comentário bobo a respeito das pessoas na rua. Mais uma vez bebeu tudo de uma vez só e mais uma vez pediu mais.

Horas mais tarde Yue estava carregando nas costas uma jovem garota bêbada e meio adormecida.
Andava por uma rua quase deserta que já não era mais a mesma daquela grande cidade, mas sim um lugar totalmente diferente em um outro mundo.

- Você é quentinho! - dizia ela vez ou outras e o apertava firmemente como a um urso de pelúcia. Volta e meia também falava coisas como "Vamos nos mudar?", "Ikaos está muito gordo!", "Eu quero beber mais!"...
De Yue as respostas eram "Mesmo?", "Vamos sim.", "Sim" e "Nada mais de bebida pra você por hoje".

Ele a colocou na cama, tirou seus sapatos e a cobriu com o cobertor.
Estava prestes a sair quando ela o segurou pela mão.

- Vai ficar tudo bem... - Ela falou. - Eu prometo. Eu vou cuidar de você.

Yue sorriu.

- Você fala demais pra uma bêbada, sabia? - disse ele enquanto se abaixava ao lado da garota e ajeitava seu cabelo roxo para dar um beijo em sua testa.

"Obrigado..."

quarta-feira, 14 de maio de 2014

I just want... To know who I am...

Ouvindo: Goo Goo Dolls - Iris
Fazendo: Photoshopando uma abobora e ajudando o Arturo

Noite passada eu deitei e fui dormir. Rolei na cama como muitas vezes costumo rolar.
De um lado para o outro e então de volta para o começo. Relaxando o corpo e voltando a contrair cada parte de mim em um vai e vem de pensamentos.
Minha mente tem um oceano próprio. Com suas ondas, marolas, tormentos e tempestades que as vezes me trazem... Me levam embora... E quando finalmente caí no sono comecei a sonhar.

Vivia uma outra vida minha que não era esta, com pessoas que hoje em dia simplesmente não estão mais por perto... E era tudo tão normal, quando meu ser anormal pode julgar.
Escolhi em meu sonho algumas dúvidas diferentes... E decisões diferentes...
Como o que vestir num dia de trabalho. O que comer na hora do almoço.
Fiz escolhas que fizeram de mim um alguém que não reconheci e que poderia invejar.

E mesmo agora, acordado, depois desse longo dia e lembrando sem qualquer motivo desse sonho tão esquisito...
Eu me pergunto...
Quantos "eus" estarão vagando em diferentes caminhos. Fazendo as escolhas que eu não escolhi. Vivendo as coisas que eu não vivi. Sendo as coisas que não sou e tomando pra si o que eu deixei passar?
Quase sinto ciumes de mim mesmo por todas as vidas que estou vivendo, em diferentes universos e ao mesmo tempo...

Eu vejo tão claramente... Cada um de mim...
Cada meu eu...

E pensando nisso eu quase sinto medo.
Meu estomago se contrai. Sinto um aperto, uma dor no peito...
Eu não sei ao certo por que.
...Não entendo.

domingo, 11 de maio de 2014

Voltando

Ouvindo: 2 hours pure epicness mix - prepare for battle (Mwahahahaha)
Bebendo: Cappuccino!

Após algum tempo longe, só quase dois anos, estou de volta.
A minha percepção deturpada faz com que eu sinta que as coisas não estão muito diferentes de como costumavam ser. Chega a ser engraçado...
É como se houvessem dois de mim nesse exato momento. O primeiro está fazendo um levantamento de tudo o que mudou enquanto que o outro simultaneamente está notando tudo o que permanece igual. Entre as duas coisas eu tenho uma tendencia a preferir acreditar que tudo continua igual... É assim que me sinto.

"- Tudo continua mudando e por isso tudo permanece igual."

O outro "eu" não tem como competir com essa afirmação.
Deixando isso de lado, vamos lá...

Meu pais recente projeto foi plagiado de meu amigo Ken. Chama-se "Disciplinator"... O nome também foi plagiado. XD
A ideia é definir uma ou mais atividades que deverão ser executadas todos os dias no decorrer de 30 dias seguidos.
No meu caso as tarefas são "Escrever" e "Photoshopar". E sim... Este é o principal motivo pelo qual trago este blog de volta a vida depois de tanto tempo.
As regras que determinei para mim em relação ao "Disciplinator" são as seguintes:

1 - As tarefas escolhidas deverão ser executadas todos os dias;
2 - A cada dia que a tarefa for executada uma marcação será adicionada ao painel;
3 - Se houver um dia em que a tarefa deixar de ser executada, independente do motivo, o painel será resetado.
4 - Se a tarefa for completada em todos os 30 dias marcados devo me recompensar com alguma coisa.

...Só não sei com o que me recompensar.
Nunca fui bom com isso.

Escrever aqui já conta como o primeiro dia da tarefa "Escrever". E o photoshop...



Por hoje é só...
Escrever ainda tem sido algo complicado pra mim.